Living between bridges

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Monday, August 15, 2011

O espírito de Yamato

Estava no meu escritório em Díli quando o sismo de 9,0 abalou o Japão. Imediatamente recebi contactos via Skype dos meus colegas em Tóquio assegurando-me que estavam bem. Eu não entendia, algo de insólito se passava pois os terramotos são um acontecimento normal no Japão e já tínhamos atravessado alguns juntos. Falavam-me dos vários fogos em Tóquio e nos feridos causados pela queda dos vidros das janelas.
Mantive contacto com os meus colegas, amigos e familiares através das redes sociais (Facebook e Twitter) e, alguns, através de email. As comunicações de voz fixa e móvel não respondiam às solicitações.

Em 3 dias registaram-se mais de 400 sismos de distintas intensidades, alguns dos meus amigos abandonaram os seus apartamentos que se moviam como navios.


O momento singular sucedeu quando um dos nossos colegas, que almoçara com clientes em Akihabara, zona de electrónica e manga, me dizia que durante o terramoto o único pensamento que tinha era de que não queria “encontrar a eternidade” em Akihabara, território dos “geeks”, cromos e “otakus”.


Nessa hora no Japão, muitos terão pensado que chegara a hora do “big one” para o qual se tem preparado e planeado, pois o Japão é uma sociedade em que para se viver há que tomar e manter múltiplos cuidados.


Quando se constrói uma habitação há que contar com os efeitos da actividade sísmica, com os tsunamis nas linhas costeiras e com os deslizamentos de terras nas encostas das montanhas. È necessário ainda ter cuidado para que não invadam a casa as inúmeras cobras venenosas, as vespas gigantes que injectam um veneno que ataca o sistema nervoso central e provocam uma morte lenta em agonia e não esquecendo outros intrusos como ursos, macacos e lobos.


Num ambiente tão difícil, onde os erros individuais podem arrastar catástrofes, não se pode esperar encontrar uma generosa tolerância a erros ou falhas. Planeamento cuidado das actividades, coordenação de equipas e uma execução imaculada tem sido desde há séculos o modo de vida. Nestas ilhas, parcas de recursos mas plenas de perigos, vive desde há mais de 5000 anos o povo Yamato; os Japoneses. Um povo que mantém a sua singularidade pois nunca foi invadido (excepto final da 2ª Guerra Mundial). Suficientemente distante do continente asiático para manter os invasores à distância e convenientemente próximo para receber as influências de outas civilizações.
Durante um dos nossos projectos na área das energias no Japão, podemos constatar que as tarefas fundamentais dos bombeiros não são o combate ao fogo e catástrofes mas sim a elaboração de normas de segurança e a fiscalização e prevenção de situações que podem originar desastres.


Mas o planeamento e uma atenção maior às coisas da razão, como o Padre Luis Froes afirmava, são temperadas com uma elevada sensibilidade, emotividade e sentido de estética. As condições da natureza e os espartilhos sociais inibem-nos de libertar as emoções mas a escrita marca o pensamento.


 Consideremos a palavra rio, que na língua japonesa é representada pelo caracter chinês (kanji) . Quando um japonês pensa num rio visualiza uma imagem, tem uma emoção que activa o hemisfério direito do cérebro; emoções. Por outro lado, quando um ocidental pensa sobre um rio, está a elaborar sobre um conceito e é o lado esquerdo do cérebro que se activa; racionalidade.
Este povo depara-se com um dos momentos mais difíceis da sua história. Não são apenas os da destruição dos terramotos e do Tsunami mas sobretudo a resolução dos perigos que emanam das centrais de energia atómica.


Eu penso e acredito que a determinação, a dedicação e o esforço do povo Japonês, bem como o eternamente presente espírito de Yamato irão demonstrar ao mundo que há sempre um horizonte azul, mesmo nos momentos em pensamos nada mais haver do que trevas.


Eu acredito: Gambare, Gambare, Gambare Nihon!

In Visão, 17 DE Março de 2011